30 de abril de 2015

atropelo

todos os dias nuvens atropelam prédios de 20 andares ou mais
o vento que balança tudo que se prende no fio elétrico
rabiolas, tênis e pombos
é o mesmo vento que joga o agora longe do tempo

já não tenho copos inteiros para usar
é sempre uma lasca, um caco ou rachadura
pra levar à boca
é sempre um corte, uma afta ou uma gota
pra calar a boca
esse mosaico incompleto que é a vida
esses retalhos e sobras de tecidos
esses recados de sombras distorcidas

a sujeira do meu pensamento
se traduz em papel amassado no quarto
as palavras por si só, não se bastam
se perdem em sentidos sem norte ou bússola
preferem a morte em qualquer esquina
se humilham e se jogam em qualquer trilho

é sempre o mesmo jogo de palavras
as mesmas rimas inocentes
rimas inocentes
rimas e no sentes
rimas e não sentes
nada

é fácil dormir e não sonhar
difícil é acordar contudo
é fácil escrever qualquer coisa que vem a mente
difícil é sentir cada vírgula que deixei de acreditar

penso no tom pra ler isso em voz alta
leio alto isso para imaginar como penso em silêncio
cada letra respirada é perdida
me falta fôlego pra dizer o que me tira o fôlego
engasgo com meus esses, erres, erros e egos
me perco, me calo e me cego
com as nuvens atropelando prédios
e eles seguindo intactos



(Giovanni Venturini - 06/04/15)

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